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100 dias do governo Lula: a reconstrução da agenda social
O terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva completa 100 dias nesta segunda-feira, 10 de abril de 2023. Marcado por contrastes em relação à gestão do presidente Jair Bolsonaro, o governo Lula 3 buscou, no período, reconstruir políticas públicas, com prioridade para a agenda de ampliação de direitos sociais, marca de suas gestões anteriores.
Mas, diante de um cenário de descontinuidades, desfinanciamentos e um consequente agravamento da crise social, encontrado desde outubro de 2022, quando as eleições se encerraram, os desafios para as políticas sociais se tornaram mais complexos. E como esta é justamente a área de atuação da carreira de Desenvolvimento de Políticas Sociais, entendemos, enquanto ANDEPS, a necessária retomada das políticas sociais federais no próximo período como um passo inadiável para a redução das desigualdades em que os mais pobres e, em particular, a população negra e as mulheres se encontram. Mais do que a relação de ações, enxergamos um caminho para a recomposição de políticas públicas baseadas em dados e evidências e com a participação ativa dos servidores públicos.
No tópico do acesso à renda, destaca-se a criação do novo Bolsa Família, com critérios e desenho de funcionamento mais eficientes. O pagamento de benefício-base de R$ 600 para famílias cadastradas, com a previsão de um adicional de R$ 150 por criança até seis anos e de R$ 50 para cada criança e adolescente entre 7 e 18 anos ou gestantes, são as grandes alterações. Esses valores serão atualizados a cada dois anos, conforme previsto pela Medida Provisória que cria o nBF (MPV n.º 1.164/2023). Retomando o modelo original do programa de transferência de renda, o nBF estabelece exigência de contrapartidas das famílias beneficiadas, como comprovação de frequência escolar dos filhos, vacinação em dia de toda a família e acompanhamento pré-natal de grávidas. Ainda no acesso à renda, a retomada do aumento real do Salário Mínimo foi efetivada pelo governo com a criação do grupo de trabalho para a elaboração da nova Política de Valorização do Salário Mínimo. O GT terá duração de 45 dias, contados a partir de 19 de janeiro de 2023 e pode ser prorrogado uma única vez. O governo prevê que o anúncio do novo valor do salário mínimo se dará no dia 1º de Maio, o Dia do Trabalhador. A previsão é que o novo valor seja de R$ 1.320, um aumento real de 2,8%.
O combate à fome é um desafio estrutural, demanda a ação integrada do governo e conta com apoio da sociedade. Nesse sentido, a retomada do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – Consea, por meio da Medida Provisória 1.154/23 já em 1º de janeiro de 2023 foi um marco importante, assim como o restabelecimento da Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional – Caisan, por meio do decreto 11.422, editado em 28 de fevereiro de 2023. Na área da educação, em 13 de março, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE atualizou em 36,4% os valores por aluno da merenda escolar por meio do Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE. Já na área da produção de alimentos, o governo federal publicou, em 23 de março, a Medida Provisória nº 1.166, de 2023, que institui o novo Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). A mesma MP também altera a Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021 para ajustar o Programa Cisternas. Uma ação urgente foi o socorro diante da grave crise humanitária do povo Yanomani, em Roraima. Foi criado o Comitê de Coordenação Nacional para Enfrentamento à Desassistência Sanitária das populações em território Yanomami e o Ministério da Saúde decretou Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional diante da necessidade de ação urgente frente à crise.
Na política pública de saúde destacam-se a retomada do Programa Nacional de Imunização, com uma campanha para ampliar as coberturas de todas as vacinas disponíveis no Sistema Único de Saúde (SUS), do Programa Nacional de Redução das Filas de Cirurgias Eletivas, Exames Complementares e Consultas Especializadas e do Programa Mais Médicos para o Brasil, que abre 15 mil vagas e espera fixar até o fim do ano 28 mil profissionais em todo o país, principalmente em áreas de extrema pobreza. Além disso, houve o auxílio financeiro às 3.126 entidades privadas sem fins lucrativos, incluindo as Santas Casas, que complementam o SUS em 1.738 municípios.
Na política pública de educação, houve o reajuste em até 200% das bolsas de estudo, pesquisa e formação de professores e estudantes, incluindo graduação, pós-graduação, iniciação científica e a Bolsa Permanência. O piso salarial de professores da educação básica foi reajustado em quase 15%. A retomada do diálogo com reitores de universidades e institutos federais foi anunciada como prioridade pelo presidente Lula.
Enquanto ação transversal às políticas sociais, destaca-se o restabelecimento da política nacional de participação social com a revogação no primeiro dia do novo governo do decreto n.º 9.759/19, que desmantelou cerca de 700 colegiados participativos. Com a medida, retomou-se a criação do Consea, que já empossou seus novos membros e definiu em sua primeira assembleia, a convocação da 6ª Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, prevista para 11 de dezembro de 2023. Também foi recriado o “Conselhão”, agora rebatizado de Conselho do Desenvolvimento Econômico e Social Sustentável. Em janeiro de 2023 foram assinadas normas que instituem o Conselho de Participação Social da Presidência da República (Decreto 11.406/23) e cria o Sistema de Participação Social (Decreto 11.407/23).
No combate ao racismo houve a publicação da Lei 14.532/2023, que equipara a injúria racial ao crime de racismo, e do decreto que determina a reserva de 30% de cargos de confiança para pessoas negras em cargos em comissão e funções de confiança da administração federal. O prazo para que a Administração Pública alcance os percentuais é 31 de dezembro de 2025.
No mês de março, marcado pelo Dia Internacional da Mulher, o governo assinou o projeto que institui a Lei de Igualdade Salarial e Remuneratória entre Mulheres e Homens que exerçam a mesma função e o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual, que busca assegurar a oferta gratuita de absorventes higiênicos e outros cuidados básicos de saúde menstrual no Sistema Único de Saúde.
Essas são algumas das realizações destes 100 dias que priorizaram a redução das desigualdades, sabemos que muito mais foi feito e há muito por se concretizar. Os desafios para as políticas sociais são gigantescos e a carreira de Desenvolvimento de Políticas Sociais faz e fará a sua contribuição técnica para a reconstrução de políticas públicas universais, eficientes e equitativas.