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Plano de combate ao assédio na administração federal é criado; ATPSs participaram da elaboração

O governo federal instituiu o Plano Federal de Prevenção e Enfrentamento do Assédio e da Discriminação na Administração Pública, por meio da Portaria MGI nº 6.719/2024, publicada no Diário Oficial da União, na terça-feira (1º/10). Já a Portaria Conjunta do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI) e da Controladoria-Geral da União (CGU) estabelece o Comitê Gestor do Programa, com a finalidade de promover, apoiar e acompanhar a sua implementação.

O Plano foi elaborado após quase um ano de discussões em um grupo de trabalho interministerial, criado em 2023, e, posteriormente, passou por longo processo de análise entre técnicos do governo. A sua implementação está prevista para ocorrer em até 120 dias, por todos os órgãos federais, criando a Rede Federal de Prevenção ao Assédio e a Rede de Acolhimento das Vítimas.

A ATPS Ariana Frances (OGU) participou do GTI, representando a Ouvidoria Geral da União (OGU/AGU), e as ATPSs Ana Carolina Quintanilha (MGI) e Danielle Henderson (IBRAM) estiveram presentes nos debates do Plano, representando seus respectivos órgãos, pelo Sistema de Ouvidoria do Poder Executivo Federal (SisOuv). 

“A iniciativa de construção desse plano traz uma perspectiva de colaboração – desde o seu debate inicial até a visão de sua implementação – a partir de uma rede de acolhimento em todas as unidades da Administração Pública direta e indireta. Diversas associações e sindicatos puderam, seja enquanto observadoras ou participando ativamente, relatar situações graves que aconteceram nos anos precedentes a 2023, e trazer, então, uma dimensão das dores que muitos servidores e servidoras passaram nos últimos anos”, afirmou Ariana Frances.

Ao longo de um ano e meio, foram cerca de 30 reuniões, oficinas e encontros com especialistas para chegar ao texto final, cuja publicação só se deu após o processo de coleta de anuência de todos os órgãos envolvidos. Mesmo antes da publicação do Plano, o presidente Lula assinou, em 31 de julho, o decreto que criou o Programa de Combate ao Assédio, com as principais diretrizes do Plano, que, efetivamente, será responsável por executar as medidas de prevenção e enfrentamento.

Para Ariana, esse processo produz melhores condições para recepcionar uma série de situações que ao longo dos anos chegaram até a ANDEPS, de uma forma não oficial, e,  eventualmente, não foram sequer registradas nos canais adequados de registro de denúncias. “Agora há um olhar institucional para que, havendo notícias de situações que alteram o ambiente de trabalho, com a presença de microviolências ou de violências mais sérias, se tenha uma atuação institucional. É muito importante ver esse esforço institucional de não deixar sair da agenda essa temática, mirando no ambiente de trabalho livre de violências, para que a gente possa expressar todos os nossos talentos e produzir valor público para o Estado brasileiro.” 

Tipificação de condutas de assédio

A portaria tipifica três condutas classificadas como assédio: assédio moral, assédio moral organizacional e assédio sexual, além de “outras condutas de natureza sexual inadequadas” e a discriminação. Haverá atenção especial à “proteção de grupos historicamente vulnerabilizados, como mulheres, pessoas negras, indígenas, idosas, pessoas com deficiência e pessoas LGBTQIA+.”

O assédio moral fica caracterizado como “conduta praticada no ambiente de trabalho, por meio de gestos, palavras faladas ou escritas ou comportamentos que exponham a pessoa a situações humilhantes e constrangedoras, capazes de lhes causar ofensa à personalidade, à dignidade e à integridade psíquica ou física, degradando o clima de trabalho e colocando em risco sua vida profissional”.

O assédio moral organizacional é tido como “processo de condutas abusivas ou hostis, amparado por estratégias organizacionais ou métodos gerenciais que visem a obter engajamento intensivo ou a excluir pessoas que exercem atividade pública as quais a instituição não deseja manter em seus quadros, por meio do desrespeito aos seus direitos fundamentais”.

Já o assédio sexual é descrito como “conduta de conotação sexual praticada no exercício profissional ou em razão dele, manifestada fisicamente ou por palavras, gestos ou outros meios, proposta ou imposta à pessoa contra sua vontade, causando-lhe constrangimento e violando a sua liberdade sexual”.

No caso das “outras condutas de natureza sexual inadequadas”, o enquadramento do plano é “expressão representativa de condutas sexuais impróprias, de médio ou baixo grau de reprovabilidade”.

Acolhimento e denúncias

Entre as medidas propostas pelo Plano, as regras de acolhimento das vítimas, são priorizadas, com determinação de resolutividade, de forma que “o tratamento correcional das denúncias de assédio ou discriminação deverá ser célere, controlado e definido como prioritário”, e de confidencialidade, para que “as identidades de todas as partes envolvidas, incluindo as testemunhas, deverão ser protegidas a fim de evitar exposição ou retaliações”.

Todas as unidades federais deverão ter em até 120 dias um plano para criar a rede de acolhimento e escuta, formada “potencialmente” por unidades de gestão de pessoas, ouvidorias, secretarias-executivas das Comissões de Ética setoriais, assessorias de participação social e de diversidade, gestoras e os gestores. Quando houver, os subsistemas integrados de Atenção à Saúde do Servidor também devem participar.

A criação de uma Comissão de Apoio ao Acolhimento com representação direta de servidoras e servidores é facultativa, mas deve ter como princípio a diversidade na composição.

“A rede de acolhimento deverá esclarecer à pessoa denunciante sobre a possibilidade de apresentar notícia, a depender do caso, na Delegacia Especial de Atendimento à Mulher – DEAM, Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância [Decradi] ou outra Delegacia da Polícia Civil. Caso a identificação do crime ou ilícito penal se dê no âmbito da apuração correcional, a unidade de correição deverá encaminhar cópia dos autos de sindicância ou remeter o processo administrativo disciplinar ao Ministério Público”.

O Plano prevê, além das punições para os casos de assédio e discriminação, sanções para o caso de retaliação de denunciantes, como demissão arbitrária, alteração injustificada de função, atribuição ou local de trabalho, e imposição de prejuízos remuneratórios ou materiais. A retaliação constituirá falta disciplinar grave, podendo levar à demissão pelo bem do serviço público.

Ainda qualifica “medidas acautelatórias”, que não se constituem como penalidade. Como medida acautelatória para preservar a integridade física e mental da pessoa afetada, integrantes da rede de acolhimento poderão promover a “alteração da unidade de desempenho de sua atribuição ou deferimento de teletrabalho, observados os normativos vigentes”, e encaminhar o acolhimento profissional e preencher o formulário de avaliação de risco da unidade.

Atribuições das ouvidorias

Todas as condutas que possam configurar assédio ou discriminação deverão ser encaminhadas para as ouvidorias de seus órgãos e unidades. Com o Plano, os casos de assédio e discriminação deverão ter “tratamento específico, inclusive na plataforma do Fala.BR., com identidade própria denominada Ouvidoria Interna da Servidora, do Servidor, da Trabalhadora e do Trabalhador no Serviço Público, que atuará na orientação, acolhimento e tratamento, com foco nas demandas internas oriundas das relações de trabalho”. 

Para a execução do Plano, o governo terá que implementar, além da Rede Federal de Prevenção, o Comitê Gestor do Plano Federal de Prevenção e Enfrentamento do Assédio e da Discriminação na Administração Pública Federal, os Comitês Estaduais de Acompanhamento do Plano Federal, além das equipes dos órgãos e entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional.

Com informações do Portal JOTA e do site do MGI.